Conhecido como o primeiro cético, Pirro de Élis foi um filosofo grego da antiguidade - 360 a.C. - 270 a.C - fundador da escola filosófica, o ceticismo, uma doutrina prática, também conhecida como pirronismo, que se caracterizava por duvidar das certezas e praticar o questionamento.
O primeiro cético, entretanto, não se preocupou em fundar uma escola nos moldes tradicionais, e não deixou nenhum escrito. As informações de que dispomos para tentar reconstruir a vida e pensamento de Pirro são encontradas em fragmentos de obras de autores que se consideraram discípulos do filósofo, sobretudo nos textos de Timon de Fliús, e nos testemunhos apresentados por Diógenes Laércios, nas Vidas e doutrinas dos filósofos ilustres.
Os princípios de sua obra são expressos, em primeiro lugar, pela palavra acatalepsia, que define a impossibilidade de se conhecer a própria natureza das coisas. Qualquer afirmação pode ser contraditada por argumentos igualmente válidos. Em segundo lugar, é necessário preservar uma atitude de suspensão intelectual, ou, como Timon expressa, nenhuma afirmação pode ser considerada melhor que outra. Em terceiro lugar, estes resultados são aplicados na vida em geral. Pirro conclui que, dado que nada pode ser conhecido, a única atitude adequada é ataraxia, "despreocupação".
A impossibilidade do conhecimento, mesmo em relação à nossa própria ignorância ou dúvida, deve induzir o homem sábio a resguardar-se, evitando o stress e a emoção que acompanha o debate sobre coisas imaginárias. Este ceticismo drástico é a primeira e mais completa exposição de agnosticismo na história do pensamento. Seus resultados éticos podem ser comparados com a tranquilidade ideal dos estóicos e os epicuristas.
Segundo Diógenes:
Pirro afirmava que nada é honroso ou vergonhoso, nada é justo ou injusto, e aplicava igualmente a todas as coisas o princípio que nada existe realmente, sustentando que todos os atos humanos são determinados pelos hábitos e pelas convenções, pois cada coisa não é mais isso que aquilo.” (Vidas, IX, 11, §61
A esse respeito, lembremos a definição do objeto do
conhecimento científico apresentada por Aristóteles, no livro VI da Ética
à Nicômaco:
Todos supomos que aquilo que conhecemos
cientificamente não é sujeito a variações; quanto às coisas sujeitas a
variações, não sabemos, quando elas estão além de nossa observação, se elas
realmente existem ou não. O objeto do conhecimento científico, portanto, existe
necessariamente. Ele é conseqüentemente eterno, pois todas as coisas cuja
existência é absolutamente necessária são eternas. (ARISTÓTELES, 1996, p. 218).
Que
disposições devemos ter em relação às coisas? Sem referencial absoluto, nossas sensações e
opiniões não podem mais ser ditas rigorosamente verdadeiras ou falsas, e, por
isso, não teríamos, na compreensão de Pirro, razão para conceder-lhes maior
atenção. Devemos ser, pois, sem opinião (adoxastos) e
sem inclinação. A mesma recomendação se aplica às opiniões dos filósofos, como
sugere outro fragmento da obra de Tímon:
Como e onde, velho, Pirro, encontraste salvação, em
face de submissão às vãs e falsas opiniões dos sofistas, e rompestes as cadeias
de todos os enganos e o encanto de suas charlatanices? Não te preocupaste com a
investigação de quais são os ventos que correm na Helade, nem quiseste saber de
que se formam todas as coisas e em que as mesmas coisas se resolvem. (Vidas,
IX, 11, §65)
Esse princípio de indiferença (adiaforia)
especulativa que encontramos, nesta citação, aplicado às opiniões filosóficas
no campo físico, estende-se às demais áreas da filosofia, em especial, ao campo
da Ética, entendida com arte de viver que conduziria a felicidade. Aqui também
encontramos um desdobramento absolutamente estranho ao pensamento grego: a
idéia de quê para ser feliz, para viver com arte, não é necessário possuir um critério
para discernir o que nos é por natureza conveniente (o nosso bem) daquilo que
devemos evitar a todo custo. Segundo Diógenes:
Pirro afirmava que nada é honroso ou vergonhoso, nada é justo ou injusto, e aplicava igualmente a todas as coisas o princípio que nada existe realmente, sustentando que todos os atos humanos são determinados pelos hábitos e pelas convenções, pois cada coisa não é mais isso que aquilo.” (Vidas, IX, 11, §61)
Exemplos de como esse princípio de indiferença fora
posto em prática são variados. Desde o caricato passeio em que, encontrando
Anarxarco preso em um pântano, Pirro não teria se preocupado em ajudá-lo, continuando
seu passeio (e ainda teria sido louvado pelo amigo por conta de sua
indiferença), até coisas bastante simples, como o fato de Pirro limpar ele
mesmo sua casa ou levar um leitão para vender no mercado. Um exemplo mais
significativo para compreensão da postura de Pirro é a narrativa do episodio em
que, perseguido por um cão, o filósofo teria buscado refúgio no alto de uma
árvore. À alguém que assistindo a cena lhe cobrará coerência com seu
pensamento, Pirro respondeu não ser fácil abandonar a debilidade humana.
Fonte: Ceticismo e filosofia
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